Quando tinha apenas 9 meses de idade, comecei a dar meus
primeiros passos, e aos 10 meses andava de verdade. Aos 11 meses, o vírus da
Poliomielite me pegou.
Deixei de andar, por falta de forças nas pernas. Parei de
sentar por falta de sustentação nos quadris. Após alguns meses, minha
musculatura dos membros inferiores estava atrofiada.
Com 1 ano e 6 meses, fui apresentada a natação.
Comecei a nadar por tratamento médico. Entendi que na água,
não existiam limitações pra mim. Eu podia, pelo menos naquele momento, estar
livre! Não precisava daqueles aparelhos pesados em minhas pernas, das muletas e
nem da mão de ninguém para me apoiar... Eu poderia voar sob as águas.
O tempo passou, nunca
mais deixei a paixão pela natação.
Alcancei uma época, acho que 1996, onde o Para Desporto, era
pouco reconhecido, e que um atleta, ou melhor, paratleta, não tinha tanta
credibilidade. Era como se fossemos crianças brincando de adultos.
Eu particularmente, aceito e entendo minhas limitações
físicas. Sei de todas as minhas dificuldades, mas reconheço minhas lutas e
conquistas apesar das limitações. Talvez por isso, não aceite o termo
“paratleta”. Não gosto de me intitular paratleta, porque o prefixo “para” nos
lembra uma proximidade ou semelhança. E não me considero semelhante ou próxima
a um atleta... Sou uma ATLETA.
Especialmente quando portamos algum tipo de deficiência (física, visual,
auditiva, mental), temos que nos dedicar com maior severidade aos treinos, para
superar todas as nossas limitações no esporte.
Hoje encontramos uma população mais esclarecida em torno do
esporte paralimpico. Ainda temos alguns percalços, como a dificuldade em se ter
um apoio permanente dos governantes em geral, em se conseguir um apoio empresarial
individual (patrocínio) e visibilidade através da imprensa.
Muitas empresas, ainda não entendem o tamanho da
importância, que é vincular sua marca a um atleta paralímpico que busca a
superação no seu dia a dia e no esporte.
As coisas mudaram, é verdade. Hoje temos o apoio importante
do Governo Federal, o primeiro maior programa de patrocínio individual criado
aqui no Brasil, o Bolsa Atleta.
Temos também empresas como as Loterias Caixa, patrocinando o
Comitê Paralimpico Brasileiro, para que sejam realizadas as competições
oficiais aqui no Brasil, o Circuito Loterias Caixa, e também patrocinam atletas
que são destaques durante as fases nacionais do Circuito. Nada mais justo é
claro!
Nas fases nacionais do Circuito, os atletas com melhores
índices (cerca de 80% do recorde mundial), têm direito a hospedagem, translado
(transporte em vãs hotel-competição), alimentação (café, almoço e jantar) e os
que ficarem entre os 20 melhores de cada modalidade, ainda recebem as passagens
aéreas.
Hoje temos também, centros de treinamento para os atletas
tops, e junto com eles patrocínios e premiações de grandes empresas e o mais
novo programa do Governo Federal, o Bolsa Pódio. Hoje, há um leque de
oportunidades para permanecer no esporte, e fazer dele nosso meio de vida...
Aos atletas considerados Tops.
Nada mais justo, se não fosse por um detalhe: Onde estão as
ferramentas, para fazer com que os atletas não tops ( aqueles que recebem o
Bolsa Atleta nacional ou internacional), sintam-se motivados e com reais
condições de treinamento, para um dia chegar a realizar o sonho de defender o
Brasil numa Paraolimpíada, e ser reconhecido e agraciado com todas as vantagens
de ser um atleta Top no Brasil?
Atleta bolsista não pode ter plano de saúde, casa própria,
veículo adaptado... Pelo menos não a maioria.
Tem que pagar um local para treinar porque muitas vezes o
clube que é filiado, enfrenta dificuldade financeira. Muitas vezes, tem que
pagar um técnico para prescrever treinamentos, tem que comprar suplementos,
alimentação adequada, vestimentas, passagens aéreas, estadias e alimentação em
competições (por ele não alcançar índice técnico), para assim não deixar de ir à uma competição e se manter no programa Bolsa Atleta e permanecer no esporte.
Como a maioria dos atletas maiores de 23 anos já tem
família, precisa também trabalhar, cursar faculdade e quando mulheres, cuidar
da casa e dos filhos, porque não tem recursos financeiros suficientes, para
pagar um ajudante.
Enfim, quanto tempo resta para treinos? 2 horas por dia
talvez... E a tranqüilidade psicológica para focar-se no objetivo de se tornar
um grande atleta e continuar a fazer o que realmente gosta? Será possível? Acho
que não...
Quantos atletas paraolímpicos, competiram doentes, mulheres
ainda em pós-parto, para não perderem o beneficio do Bolsa Atleta? Vários! Eu
sou uma delas. Por que? Por falta de uma elaboração coerente dos regulamentos,
porque talvez os dirigentes, não estejam tão “perto” dos atletas que ainda
estão tentando se erguer nesse cenário.
A impressão que se dá, é que todos os nossos colegas, que
hoje alcançaram os pícaros do esporte Paralímpico, jamais passaram pelo que
muitos atletas passam hoje: dificuldades.
Faz-nos pensar da seguinte forma: Nunca vou conseguir chegar
aí.
A estrada é muito árdua, é uma luta sem tréguas, cada vez
mais exaustiva, porque a cada ciclo, uma nova regra é estabelecida, sem que nos
de suporte para atendê-la.
Sem falar em nossa classificação funcional. Nossa!
Como é difícil você ter seqüela de poliomielite, sofrer com
os avanços da SPP (Síndrome Pós Pólio), e por isso não andar e não ter mais o
mesmo desempenho devido à fraqueza muscular extrema, e no balizamento da prova,
olhar para o lado e ver uma atleta de pé e se aquecendo com pulos (risos). Te
dá uma sensação devastadora de impotência e derrota.
Já pensou se existisse um centro de treinamento para
iniciação e incentivo ao esporte paralímpico? Não estou falando de jovens ou
velhos não... Estou falando de atletas em potencial para treinamentos e
competições a nível nacional e internacional. Quem quisesse e demonstrasse
disciplina para permanecer, então teria todas as condições para um dia chegar a
patamares mais altos, e assim jamais faltaria incentivo para que tantos atletas
permanecessem no esporte paralímpico.
Sabemos que a maioria dos atletas veio de batalhas árduas,
enfrentaram muitas dificuldades, muitas lágrimas e muita dor, e merecem todos
os nossos aplausos. Mas se o Brasil evoluiu no sentido de apoio ao
paradesporto, será que não está na hora evoluir em novas oportunidades?
Nem vou citar exemplos de países estrangeiros, porque ainda
tenho a esperança de que o Brasil mude por si só, por sua consciência e senso
de justiça e cidadania.
Mas de uma coisa tenho total ciência: É muito fácil apoiar
aquele que já está de pé, porque o peso não se recai sobre o nosso
braço... Assim como é muito fácil falar
que representa o esporte parolimpico , e na realidade representar apenas a si
próprio.
#MudaBrasil
ADRIANA AZEVEDO